quinta-feira, 15 de outubro de 2009

CARTAS DE AMOR


Como eu disse ontem, de agora em diante escreverei aqui todos os dias. Não apenas sobre os livros que leio, e que são lançamentos, mas também sobre aqueles que na verdade são eternos. O livro de hoje foi publicado pela primeira vez em 1690: CARTAS DE AMOR.
As cartas foram atribuídas a SOROR MARIANA ALCOFORADO apenas após o ano de 1810, antes disso, apesar de terem sido publicadas especulava-se quem as teria escrito: Racine? Guilleragues? Ou Mariana Alcoforado? O que sabemos é que as CARTAS têm hoje um lugar consagrado na história da literatura.
RAINER MARIA RILKE nos deixa o seguinte comentário: "Estas cinco cartas foram capazes, pela primeira vez, de desenhar os limites do amor da mulher, sem excessos, sem exagero e sem complacência, como se escritas pela mão de uma sibila... Ninguém permanecerá cego ao que demonstra o exemplo dessa amante suprema e seu deplorável parceiro, ninguém deixará de compreender o que revela a relação desses dois, toda a força, toda a virtude que, do lado da mulher, vem se opor à completa insuficiência do homem em matéria de amor."
Deixo aqui para você parte da primeira carta, e acredito que, se começar a lê-la, não deixará de procurar pelo final da mesma, e pelas outras quatro.

PRIMEIRA CARTA
Pense no quanto você não conseguiu prever o que aconteceria, meu amor. Quanta infelicidade! Fomos traídos por falsas esperanças. A paixão em que você depositava tantos planos de alegria não lhe causa hoje senão extrema angústia, só comparável à própria crueldade da ausência que ela mesma provoca.
Será que essa ausência - à qual minha dor, por mais complexa que seja, não consegue dar um nome amargo o suficiente -, será que me privará para sempre de olhar nesses olhos em que eu via tanto amor, que me moviam, que me enchiam de alegria, que me valiam por todas as coisas e que, enfim, me bastavam?
Eis que os meus é que foram privados da única luz que os animava. Não lhes resta senão lágrimas. E eu não os tenho empregado em nenhum outro objetivo que o deste choro ininterrupto - depois de compreender que você se decidiu por um afastamento tão insuportável para mim que me fará morrer em pouco tempo.
Mas parece que eu tenho uma fixação qualquer até mesmo por essa infelicidade de que você é a única causa. Assim que o vi, entreguei-lhe minha vida; e sinto mesmo algum prazer em sacrificá-la por você.
Mil vezes ao dia envio na sua direção os meus suspiros; eles procuram você por todos os lugares e, como recompensa para tanta ansiedade, não me trazem senão a mais franca advertência da minha má sorte - ela é que é cruel o bastante para não tolerar que eu me iluda, e que me diz a todo momento: pare, Mariana, sua louca, pare de se consumir em vão, de procurar por um amante que você não verá nunca mais, que atravessou os mares para fugir de você, que está na França mergulhado em prazeres, que, não pensa um único instante nessas sua dores, e que, ingrato, dispensa todo esse seu delírio...


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